26.2.09

o script não foi seguido e a barba mal feita, tal como as unhas dela que não tinham mais a cor de café expresso. dessa vez, pintou-as francesinha e cortou os cabelos escuros.

Ele, cujo nome ela nunca revelara a mim, não gostou daquela mudança, ele gostava tanto de café que chupava seus dedos finos e pequenos quando os via com aquela cor. Maria sabia disso e usava bem essa fraqueza, que era como um código que ambos elaboraram ao silêncio. Era ela aparecer com aquelas unhas e ele sabia que podia quando bem quisesse atravessar as mãos pelo vestido ou saia. Coisas de casal, todo e qualquer par que se preze inventa uma linguagem própria, cheia de símbolos, significados que pertencem ao número restrito de pessoas, dois. Uma amiga de Maria comentou durante a semana sobre um 'sinal' do seu marido, se ele olhar para a tv e o relógio com aquela expressão, a sobrancelha esquerda mais elevada, ela lhe vinha com o jornal. Maria de repente se imaginou servindo café e não o seu desejo ardente se continuasse com aquela linguagem. Por isso, pintou as unhas à francesinha no outro dia de manhã e chegou com mais vontade de ter aquele homem dentro dela do que em qualquer outro dia. Ele assustado pensou duas vezes antes de passar as mãos por entre as pernas de Maria ainda no carro, mas ela se vestiu pra isso e com elas entreabertas convidava os olhos dele, bem como suas mãos. Foi quando ele disse:

- porque as unhas estão claras hoje?
- resolvi mudar, meu bem
- e porque? gosto tanto delas daquela outra cor...
- eu sei, mas é melhor não cair na rotina. Me beije aqui - disse ela apontando para a boca fresca.

Ele a beijou, e seu pensamento era uma confusão, havia apenas alguns meses que saiam juntos, encontros que eram casuais porém com certa regularidade, que o atormentava uma noite ou outra, mas que ele sempre cedia porque, como ele mesmo admitia, Maria tinha o gosto muito bom, era gostosa. Intrigava era essas ações dela, que gostava de ficar só algumas vezes, em um silencio absoluto, e virava e mexia, saia com uma dessa de cair na rotina, fugir do compromisso, descarrilhar o trem, não que ele quisesse que fosse tudo certo, como manda o script, não, ele gostava da casualidade, da amizade colorida, da intimidade que existia muito mais na cama do que em qualquer outro lugar. Foi um tormento quando abriu os olhos novamente, já estava ela de olhos abertos, e foi a primeira vez que ele percebera que ela sempre abria olhos primeiro que ele. Começou a observa-la mais de perto, com mais precisão ou atenção.

Ela ainda abaixando a mão em direção ao peito dele, sentiu a aproximação do corpo grande daquele homem muito rápida, ele fugia de algo, pensou ela, e enquanto o beijava não conseguiu como nos outros beijos, apenas senti-lo, ela se indagava daqueles olhos fechados, daquela rapidez da língua e não mais podia fingir sentimento, abriu os olhos. Foi quando ele percebeu.

Não conversaram mais que meia hora e foram pra cama, daquele dia em diante ele pensou ser outro código inventado, unhas à francesinha era sinômino de mais desejo e ela pensou ter rompido com um código. enganaram-se os dois, mas não a mim.

(perdoe-me terminei o texto desajeitado, nem falei do corte de cabelo dela, mas é que preciso continuar com as fotos, e os amigos me chamam querendo-as.... outra hora ou dia continuo e justifico, não coloco como rascunho porque então aí é que eu abandono a estória... já tem tantas coisas que abandono que preciso me manter presa pelo menos nisso aqui.)
naquela tarde com as mãos tremendo invadiu sua própria boca
com força e sem piedade de si travou uma briga com seu corpo
conseguiu passar pela garganta e chegar ao peito - ali onde estava seu coração e logo atras o pulmão.
fechou os olhos e sentiu o afago, a dor, e suspirou profundo
com as unhas arrancou aquele pedaço de amor
deu umas porradas no outro órgão e
sentiu o alívio que causara a paz
esta, fugiu-lhe de medo.

foi assim quando o caos se instaurou.
fabriquei a taça de vidro brilhante e com o vinho retirado de mim mesma fui à mesa com você. comi teus sonhos e saboreei o sabor que saia da tua boca doce. era doce... mas acabou. furei teus olhos e salivei teus cílios, cogitei a idéia de manter-me ali, ao lado do teu corpo, morto, que parecia-me mais vivo do que nunca. mas fugi e deixei-lhe uma marca profunda, agora não podias tu, daqui pra frente, ver amor em mais ninguém.

25.2.09

é quarta-feira de cinzas
e o meu corpo mais moreno
a boca ainda mais vermelha
tal como o desejo - só, que de cor intensa
ah, e os sonhos? azuis como o céu.

20.2.09

hoje eu estou tão bem que só uma palavra chula transmitiria a sensação
hoje eu to bem pra caralho.

foi dia de poucos amigos e só um dia pra mim
eu indo de encontro ao meu autor preferido
redescobrindo que tenho músicas na barriga
na garganta tenho um grito surdo
no peito um amor imenso

só explico isso porque hoje
estou do tamanho do mundo
ou maior que ele. e sem exageros.

18.2.09

não aguento as palavras dentro da minha cabeça e não importa se vocês não vão acompanhar o ritmo ou vão dançar num outro, diferente, feito samba ou um bolero. não há na vida e tarde quente uma macia saudade. não há nada macio e isso é de assustar. porque vai ver [e ser] que as coisas devem deitar em suas camas e dormir o sono delicioso que me foje entre as pernas como um liquido, como vidro, pó de vidro, que não é feio mas perigoso... pó de vidro... corta tambem e faz o mesmo mal que outrora poderia fazer quando em outro estado. fumaça preta mesmo, como fogos do jogo no maracanã ou da polícia quando entra na favela e pouco [ou nem] se importa com quem anda descalço e sem camisa porque corria atras de pipa. na vida prática pouco importa quem você é, importa mesmo o que acham que você é. vadiagem, pura vadiagem, vagabundagem. repito em mais um melodramatico digitar e tilintar dos dedos cheios de sujeira.... vagabundagem. não vá despistar o silencio com fuga dos olhos para textos e sátiras, nem noticias de jornal, nem me diga a profundidade dessa lama que você fez na minha vida, nem refaça os planos que não deixei me contar, fabricara tão bem meu balanço que nunca pude me sentar nele já que minhas pernas não alcançavam o chão, e por isso mesmo o fim que almejava (o de me balançar no balanço) nunca foi concretizado. por isso não me satisfiz com essa merda de verso sem rima, apesar de em apenas uma parte ser bonito e pôr pra fora algo que senti nessa tarde. e como um padre lhe digo nessa hora, quero é isso escrever em verborragia, com milhares de palavras e sem medir a forma que causam aos olhos [seja de quem for]. por cima da perna que depilei hoje mais cedo me caiu um pedaço do chocolate que desde ontem desejei feito sexo, sim ele não foi tão bom quanto o ultimo que fiz, sinto o cheiro ainda dele aqui na perna e me dá mais vontade de saciar com coisas industrializadas e não com um corpo quente ao meu lado. sufoco mesmo esse querer e não me contento com isso, e mais. vejo nisso algo bom pra criar, e ocupar a cabeça vazia e o corpo frio. não fiz nada hoje, nem a atenção consegui prender nas minhas unhas enquanto dádivas de trabalho duro contra o vicio. ai os vicios. são eles como já disse tanta gente, combustiveis que fazem a alma reviver mas a faz morrer mais rápido e isso é justificado porque é intenso. não vou me pôr a falar mais e mais de intensidade, nem de virilidade, nem de outra ..ade que não me vem a cabeça. falo apenas desses fluxos descontinuos embaraçados e confundiveis, não sou tão boa como quem escreveu "a meia marron" e duvido muito que um dia chegarei num nivel desse mas só a tentativa de vomitar as palavras me impulsiona na tarefa, que não deveria ser concomitante ao som de bob dylan, mas cairia melhor um classico desse da vida, quem sabe mozart. mas de qualquer maneira o som é influencia que não é determinante nem amplarmente importante nessas horas, porque sou quase surda de um lado (apesar de ainda não descobrir que lado é) e por isso até quando me reservo o papel de bisbilhoteiro a la goffman numa conversa não o desempenho com sucesso.... perco falas e fio da meada. quase como o que ocorreu em algumas linhas atras, mas é uma viagem, sempre, uma viagem. e nessas horas você pode revisar e recriar o caminho, que foi asfaltado com algumas leituras extraviadas da caixa de correio do vizinho... e prefiro assim, porque se fosse de barro, chão de areia, mudaria mais rápido e sendo assim não saberia explicar a dinamica que acomete a vida diária. por isso quando a fulana fala que voltou da europa e tem uma porrada de coisa pra contar [e os bicos do peito dela parece gritar junto], tento fugir do som e aquela puta continua a falar, ah professor... ela voltou, com as pernas de fora e o cabelo longo. aquele cabelo que me incomoda tal como o da outra sempre ensebado. é demais pra mim e isso é alguma inveja e tenho consciencia [plena] disso.
aviso, sou invejosa. e machista. e pouco me importa se isso é da ideologia dominante e se até na arqueologia as pessoas querem ver lutas de classes, que hodder vá pro inferno, assim como aquela amiga de cabelo duro que anda me desprezando. é demais pra um ser de 1,60 de altura. a minha outra amiga traiu o namorado e me conta isso com remorso, eu lhe pregunto: gozou? ela gostou e ficou até com marcas pelo corpo (isso me dá até vontade d ficar com algumas também). então, há coisa melhor?! sim, há coisa melhor. companhia e a cumplicidade de entender o outro no olhar. respeito os casais duradouros mas acho que nunca alguem gostará de me ter com par, porque nasci não pra ser sozinha, odeio ficar só e odeio ter que assumir isso... sim nasci pra ser par pra mim. é a alma que tem 1,80 de altura e me serve bem de companheira, é meu lado macho falando mais alto apontando uma arma pra mim e perguntando: qual é a tua [meia] mulher?!
qual é a minha, porra? o que eu quero com isso... muita coisa. de tanto pensar me perco no pensamento. outra hora lhes digo como termina isso, apesar de saber eu e vc que isso nunca acaba. como também nunca acaba o tempo inventado arbitrariamante e esse sentimento que me confunde a cabeça e a minha própria ideia de espaço e minha causa de fome, e sede. falta é tesão pr'os estudos de gente viva, porque me vejo nelas e seus problemas colam em mim. é um grude. uma merda. sei que isso que escrevi não vai agradar a algumas pessoas mas saciou meu disturbio de porralouquice -por enquanto.
é como ferida mal curada
lápis sem ponta
túnel sem saída
metade d'um mesmo corpo
[ou da laranja?]

truculento
compêndio do amor,
arrogante
manual das relações,
não há rima
nem pobre
[talvez]
uma arritmia

feito poesia concreta
discreta
repaginada mas pouco sofisticada
só que alumiada
com talento
e brilho de olhos de gente que está a sonhar...



p/ "Vontade de Início da Noite"

17.2.09

não poderia eu dizer coisas fantásticas aos seus ouvidos e saborear as tensões que tais coisas causariam? suplico um pouco de boa vontade e tu me surpreenderias o peito. poderia era sufocar minhas lamurias apenas com um beijo apaixonado, de olhos fechados e gosto de vinho ou canela. a resposta nessa cena seria a de mulher embaraçada que no fundo dos olhos carrega a vontade de junto estar, mas desperdiça o tempo por nada falar e por isso mesmo não conhecer. Pero quizá, melhor não conhecê-lo. E digo, duvidaram de minha inocência quando ao assumir o papel de filha rejeitei o de amante e quando displicente direcionei o olhar para aquele espelho rachado e contemplei o quadro bem pintado que atacava o cotidiano - era mais organizado e bonito que o próprio real.

Imaginei a fotografia que faria e o retrato que nunca me deixaram concretizar. um desejo meio bobo que como um silencio surdo se espalhou pela casa... escondi a camera em baixo da cama e sussurrei à minha própria alma a correnteza que me levava por aquela luz pobre que entrava pela janela. Confesso, até hoje não tirei a camera de lá, e a covardia que afogou o peito em lágrimas não se contentou com minha abstinência, faz já dois meses que não fotografo e cinco séculos que não vivo a experiência de ver o outro pelo visor. é como cinco séculos, apesar de nem três décadas este corpo ter. balbucio algum verso torto que de encontro a minha esperança de fazer algo novo se perde em mais uma tentativa frustrada. gostaria era de poder colocar uma foto aqui e os olhos de meus leitores verem poesia nela. poesia, conto, quem sabe, ensaio. não aprofundaria nada, tal como são meus textos, meus trabalhos e minhas sensações.

confuso em certa parte e não era pra ser até certo ponto.

é um tirocínio. uma caminhada sem erros ou acertos, só um caminho. um dia espero encerrar minhas incertezas numa frase de efeito, frase que será lida pela percepção, e os signos serão os elementos do quadro instantâneo. invenção, criatividade desassossego da mente. fugir de certos pressupostos garante que construamos outros, mas irresponsavelmente me indago sobre que inventividade é esta. que obra e pessoa se reserva espaços de tempo para este fim? e por que deveria eu me prestar a isso? não há respostas e no fundo nem as procuro, me contento com a evanescência que me é característica.

***

costumeiramente (gosto muito de usar "mentes" nos escritos) aplico uma fórmula que as vezes funciona e me agrado com o resultado... mas hoje foi diferente e após escrever veio uma onda que apagou tais sensações. não vejo motivo pra esse comportamento e não consigo explicar a mim mesma as causas dele. confesso que juntar as palavras desta maneira resumem e mostram a incerteza que consome algumas horas dos meus dias, porque é rotineiro demais. esqueça.

15.2.09

não poderia ser diferente, a madrugada nunca é boazinha feito tia-[a]vó do interior que tira leite de vaca e oferece goiabada feita com carinho pra você. a madrugada é como a tarde ensolarada dentro de um metrô do rio de janeiro: quente feito o inferno, apertado tal como um espartilho do século XIX e feio como o diabo.

é, isso mesmo. o sono não vem e as memórias sacanas te invadem a cabeça, a mente, os olhos, o corpo. e quando vê, aí que a insonia te domina e não há no mundo ser que se desprenda dessas miudezas.

e não há no mundo ser que se desprenda dessas miudezas?

não há no mundo ser que se desprenda dessas miudezas.


envolver-se com alguem requer uma certa organização espacial, um senso de direção e um sonífero que funcione e não ofereça contra-indicações intelectuais. a concentração nesses casos é a mais afetada e enquanto o trabalho te chama o desejo de puxa pela perna e dá uma rasteira daquelas, um carrinho por trás na pequena área e você puto pede ao Juíz um cartão vermelho.
Aí, a galera vai ao delírio! Você vai ao delírio.

a confissão feita às paredes enquanto os olhos se dirigem ao teto é secreta, que deve ser mantida em segredo. porque cada canto da casa deve ter uma lembrança, uma marca e tudo na vida e no mundo é assim. o meu pé direito guarda o dia em que desobedeci minha avó e abri a porta do guarda-roupa e maldita caiu nele. é no próprio corpo que a história se faz.

13.2.09

é como uma fascinação e não importa como ele está dentro de mim, o sentir é forte e jorra feito impulsos descontrolados (melhor, não passiveis de autocontrole). o que importa de fato é que assim o tempo faz seu papel e passa calmamente, não porque mudou seu jeito de passar e sim porque a dona aqui mudou lentamente seu jeito de viver.


Ps.: Desconfio dos bons moços. E mais ainda da minha polidez.

7.2.09

a nudez do corpo e dos sentidos e do medo
causaram aos olhos alheio o desvio de mim
hoje estou invisível e ninguém pode falar comigo.
quase um outro ciclo. por um triz outra vida

a poeira abaixa e o sono perdido retorna ao seu dono,
volta também uma ponta de felicidade solitária
um misto de surpresa com esperança e calma

***

há em algum lugar nesse mundo de deus
uma lógica que permite esse passar, esta mudança.
tal como colo de mãe
ou o carinho do amor
[vide a bula da sensação [boa] que tais coisas oferecem]

a imaginação ajudará descobrir onde fica,
e a saída será fotografar,
localizar e marcar no google earth para que todos tenham acesso a ele
(me entende? acesso ao tal lugar tal como colo de mãe e carinhos do amor)
daí não precisaremos mais de mães nem do amor nem de colo nem de mãos, abraços.
só um lugar, meio imaginado, meio real. meio lá e cá.

5.2.09

curtíssimo capitulo III: sobre ele


Sempre aquele semblante mostrava-se calmo e o apreço que possuia por aquela profissão era muito grande. Estudara muito por muito tempo e de alguma maneira podiamos ver em suas falas comentários cândidos em relação ao seu futuro. Polido. Gentil. Funcionava feito máquina e tinha gostos normais para os que o vissem de fora e esquisitos para alguem que o visse por dentro. Repetidas vezes concordara que a ideia de se envolver naquele momento com outro ser, desprovido de uma armadura contra as tentações do seu desejo, lhe culminaria numa emboscada. Sem ser destro, com destreza caminhava pelos assuntos e tinha um humor elevado. Um requinte no andar e paladar, com bom ouvido. Bom entendedor no melhor sentido da expressão do comercial de cerveja. Para ele, meia-palavra-basta.

Numa noite pegou-se sem dormir ao pensar no vazio que sentira naquele dia, um dia duro que nem mesmo as pequenas doses de bebida no inicio da noite aliviaram as tensões dos ombros. Queria era uma massagem de um par de mãos leves, talvez pequenas. Fazia pouco tempo que preferia o costume de ser só mas tinha a necessidade de dormir acompanhado de um outro corpo alguns dias. Meio macho, meio homem, meio moleque, mas gostava mesmo era de ser o primeiro - um toque mais selvagem nas palavras já que nos gestos e no olhar era tão feminino como uma moça. Sussurrou para seus próprios neurônios as atitudes que devia tomar e a concentração que deveria manter no trabalho até que não aguentou. Pegou as chaves e saiu pra ver estrelas com o vento do mar soprando aos ouvidos a melodia da calma no odiado, mas desejado [somente naquele momento] silêncio.

3.2.09

foi um tempo de intensas descorbertas e afogos do peito
repetidas vezes o recheio da sobremessa foi consumido com maior vontade que a cobertura
e uma dúzia de pensamentos voaram como folhas secas entre os carros engarrafados na perimetral.
o castelo de areia desmorounou-se como também o corpo da morena escupida com cuidado em copacabana - a bunda ficou defeituosa.
os sinais vermelhos não siginificavam parar - eram alertas para os sonhos de peixes fora d'água que como amigos viviam em bolsos e tomavam suco de laranja no sertão nordestino.
surpreendeu-se o coração de alguem quando o pivete tinha como arma bolinhas de sabão
e a armagura que sentia se foi como agua corrente, incolor e que bebia-se sem filtrar.

1.2.09

curto capítulo II: sobre ela

Pensava ela, no nosso belo-azul-ensolarado dia de manhã, nas coisas que fizera naquela tarde anterior. Diante do espelho com o creme de espinhas espalhado pelo rosto - creme que fazia dois anos que estava no depósito de coisas inuteis, acompanhado do baton cor de boca, da meia calça fina, do secador de cabelos - repetia as frases compulsivamente, as frases que deveria ter dito a ele com alguma irresponsabilidade, como ele já tinha feito algumas vezes com ela. Os olhos de cor castanho-comum lagrimejavam e com o rude pensar sugeriu a si mesmo que era a validade do creme que estava vencida. Na verdade não adiantava chorar agora, muito menos pragejar o gozo rápido de uma tarde quente.

10:33 AM chegou perto da geladeira e a abriu procurando algo para mastigar, viu só uma garrafa d'àgua e lembrou da crise renal do seu amigo, e friso, não lembrou do amigo, ele já martelava a cabeça de Maria [que não era Tereza, nem Das Graças, muito menos Luísa) desde as 5:48 AM com aquelas imagens difusas de sorrissos, beijos, carícias e de concentração na leitura de livros. Maria [só Maria] permitiu-se voltar alguns dias do tempo corrido da vida e rememorar umas poucas trocas de olhares tímidos nos meados do ano anterior. Por ela estas lembranças poderiam sofrer processo de decomposição, mas as ingratas não saiam dela, as levavam era de volta a tempos passados quando ainda não conhecia as formas do corpo humano como convites irrecusaveis ao prazer. Ficou a indagar-se quantas mulheres aquele amigo já possuira e quantas frequentavam aquela cama confortavel e afixionada por aquelas performances delirantes queixava-se do pouco ritmo de seus movimentos. Foram dois minutos que a enxurrada da memória veio em um fluxo intenso e ao fim deles concluiu sua fragilidade: não poderia nunca confiar em alguem pois até ela colocara-se na mira dos que deveriam dormir e não acordar. A filosofia de Maria era que a vida vale a pena se a consumimos com vontade e destreza. Concordo com ela numa parte. E ela até que consumia a vida com vontade, todavia a habilidade nem a experiência havia lhe proporcionado em quantidade necessária.

Voltou os olhos para aquele livro de capa rosa e páginas amareladas decidindo o resto do seu dia, deitada nua na cama em pronação devoraria cada fonema daquele velho que tão bem escrevera sobre paixões humanas. Talvez compreenderia sua condição - que até deveria ser passageira só que as concepções de Maria e do Tempo de passageiro diferiam muito, para a primeira deveria ser rápido e medido em dias, para o segundo não deveria ser nem isto, nem aquilo, nem medido podia ser.

Declamava Maria
" - a alma que possui a mais longa escala e mais fundo pode descer,
a alma mais extensa, que mais longe pode correr e errar e vagar dentro de si,
a mais necessária, que com prazer se lança no acaso,
a alma que é, e mergulha no vir a ser, a que tem, e quer mergulhar no querer e desejar,
a que foge de si mesma, que a si mesma alcança nos circulos mais amplos,
a alma mais sábia, à qual fala mais docemente a tolice,
a que mais ama a si mesma, na qual todas as coisas têm
sua corrente e contracorrente, seu fluxo e refluxo - "

Perdoe-me, mas devo adiantar. Maria tinha uma alma livre e sofria por isso, queria prendê-la dentro de si. Não conseguia. A velhice era esperança para ela e sua mãe com o olhar de lince esperava isto também. Conversavam muito apesar do silêncio constante de Maria, a mãe vezes por outra argumentava diante da filha sua precisão de colocar para fora em som o brilho dos olhos perdidos em tormentas nuvens. A filha ignorava, era silenciosa e arrogante. Até a forma de andar denunciava tais características.

Lera naquele dia entre perdas de raciocínio e cochilos, 117 folhas. Tomou um café forte e vestiu-se bonita para conquistar uns elogios. Pegou a bolsa comprada na feira de todo sábado na praça e saiu a rebolar com certa decência, podia ser sensual, mas odiava ser vulgar e percebera que deixou-se ser por duas horas no dia de ontem. Quando findava o dia pensou no cheiro daquele lugar e até podia sentir - de longe - o gosto do suor amigo. Comeu, sorriu e pensou sobre o mundo e um filete sobre arte. Dormiu sem vê-lo aquele domingo e saboreou a vantagem de ser só quando queria.

21:35 PM. Ela não dormiu sem vê-lo, na verdade ele apreceu lá acompanhado de alguem que parecia melhor que Maria. A unica saída foi desviar o olhar e fingir não ver, porque ela já não sabia o que era, nem o que sentia... um misto de decepção com vergonha, de raiva com medíocridade. Arrependimento talvez. Podia ser de mil maneiras mas foi dessa. Agora de noite tudo parece irreal.
From: Jaqueline
Sent: Saturday, January 31, 2009 17:12 PM
To: Jaqueline
Subject: Frustração


é no final sempre tudo fica bem
eu esqueço do pouco apego,
do chamego que não ganho.
guardo o ato selvagem - selvagem em certo ponto.
e me ajeito entre os lençois.
não me importo com a fuga do olhos
compreendo demais tal atitude
minha alma viaja por aí
e só o silencio fica ali
junto ao ruído que sai da tv.